A sapiência de fazer “chover no molhado” ou a arte de empatar reuniões…

 Nas escolas é comum convocarem-se reuniões de carácter obrigatório com demasiada frequência, por vezes, injustificáveis e de pertinência duvidosa…

E já nem falo daquelas reuniões que se realizam apenas, e só, para cumprir determinadas formalidades porque as decisões, essas, já foram efectivamente tomadas por outros…

 Enfim, reuniões muito frequentes, “a metro”, previsivelmente redundantes, e/ou demasiado longas, costumam significar desperdício de horas em actividades inúteis e improfícuas…

 Devido a algumas discussões inconsequentes e/ou a monólogos supérfluos e desnecessários, por vezes, esgota-se o tempo máximo previsto para a duração da reunião e podem ficar por tratar alguns assuntos efectivamente relevantes e pertinentes. Nessas circunstâncias, ou se convoca nova reunião ou se dão por tratados esses temas, ainda que cabalmente não o tenham sido…

Frequentemente, fica-se com a sensação de que uma reunião que se prolongou por mais de duas horas poderia ter sido realizada em metade desse tempo, se a comunicação entre os respectivos intervenientes tivesse sido realizada de forma mais pragmática e eficiente…

 Reuniões que se arrastam por tempo infinito; pessoas que nunca têm pressa em concluir qualquer reunião; pessoas que repetem o que já foi dito e redito, sem acrescentar nada de novo; pessoas que apresentam recorrentemente dados irrelevantes ou fúteis; pessoas que gostam muito de se ouvir a si próprias… Discursos quase sempre fastidiosos, “redondos” e redundantes ou marcados por grande dispersão…

 Às vezes, há pessoas que parecem considerar que a respectiva competência se mede pela sua capacidade de debitar palavras ou que parecem recear que a sua competência possa ser posta em causa se afirmarem simplesmente que não têm nada a acrescentar ao que já foi dito…

 E não estou sequer a refutar a importância daqueles momentos triviais, de descontração ou de bom humor, que também são necessários durante uma reunião, benéficos para renovar o estado de concentração e retomar o enfoque nas temáticas em apreço…

 Em praticamente todas as escolas também existem pessoas peritas naquilo que comummente se designa por “conversa de treta”, conseguindo, quase sempre, colocar um tom muito enfático em todas as suas palavras, esperando, talvez, convencer ou persuadir os outros da imensa importância de tudo o que afirmam…

 O que afirmam é sempre tido por si como muito pertinente e deve, por isso, suscitar a maior atenção e o maior interesse por parte de quem os ouve, quer estejam a dissertar sobre o estado do tempo, sobre medicamentos homeopáticos caríssimos (ênfase em “caríssimos”), supostamente muito terapêuticos, ou sobre os benefícios do chá de malva na prevenção e no tratamento das hemorróidas…

 Depois também existem os que acham que devem ter sempre a “última palavra” e que nunca erram, mesmo que algumas das suas falhas ou enganos sejam óbvios e notórios para os restantes… Pessoas assim costumam considerar que a sua suprema competência e a sua superior sabedoria as coloca sempre num pedestal acima de qualquer crítica ou reparo…

 Uns e outros, parecem acometidos por manifestações crónicas de egocentrismo e/ou de falta de noção do ridículo e do absurdo. Ou de ambas…

 E como na escola prevalece, demasiadas vezes, o inevitável e artificial, “politicamente correcto”, torna-se difícil, mas muito tentador e apelativo, proferir em certos momentos afirmações deste género: “a sua mensagem foi recebida, visualizada e ignorada com sucesso” (frase de autor desconhecido, roubada da net)… Mas lá que apetecia, apetecia…

 Quando a paciência infinita não é uma virtude, é fácil cair na tentação de começar a “bufar” ou a revirar os olhos, apesar disso também não ser aceitável do ponto de vista do “politicamente correcto”… Mas também não será caso para se fazerem grandes dramas: aspirar à paciência infinita ou à castidade são desígnios apenas alcançáveis por Sant@s…

Assim sendo, resta-nos a resiliência…

Resiliência é aguentar uma reunião de duas horas a discutir o “sexo dos anjos”, sem perder o controlo ou a compostura e sem mostrar sinais de irritabilidade, conseguindo recalcar a frustração e dissimular muito exaspero e alguma raiva… Isso, sim, é resiliência…

 Ir fazendo pequenos rabiscos, imperceptíveis para os outros participantes, numa folha de papel, no sentido de alcançar alguma abstracção, pode ajudar… Tentar pensar em algo positivo, como alguma actividade a realizar assim que se sair dali, e que possa mitigar possíveis efeitos entediantes, por exemplo comer pão com manteiga, inalar algum fumo de tabaco, ou ingerir uma boa dose de cafeína, também…

E, sim, procurar o conforto emocional proporcionado pela comida numa situação como esta, é perfeitamente aceitável e desculpável…

Quanto ao tabaco, não se recomenda em nenhuma situação, mas compreende-se a necessidade do seu consumo em determinadas ocasiões… Já a cafeína não pode deixar de se considerar como imprescindível, depois de uma longa “conversa para boi dormir”, segundo expressão utilizada pela cultura popular brasileira, no sentido de ilustrar algo semelhante ao descrito…

 E, não, com o anterior, não se pretende fazer a apologia de consumos aditivos ou de dependências (comida, tabaco, cafeína), tão “politicamente incorrectos” nos tempos que correm, como poderiam pensar os defensores mais ortodoxos e acérrimos dos “bons exemplos”, dos “bons costumes” e dos estilos saudáveis de vida… Mas também não pode deixar de se enfrentar a realidade, ignorando-a ou mascarando-a…

 A esse propósito, e na tentativa de aliviar algumas tensões do momento, fica esta anedota, profundamente “politicamente incorrecta”, que circula por aí: “Fiz uma dieta rigorosa, cortei no açúcar, nas gorduras e nas proteínas. Abstive-me de consumir álcool e tabaco, pratiquei exercício físico todos os dias, bebi muita água e dormi cerca de nove horas por noite. Em duas semanas, perdi 14 dias”.

 E, ainda, assim, nessas alegadas reuniões, ir esboçando pequenos sorrisos, mantendo, de vez em quando, o contacto ocular com cada interlocutor e fazer um ligeiro acenar de cabeça, numa manifestação de (falsa) concordância com ele, pode ser considerado como uma atitude cínica e hipócrita? Sim, claro que pode. Pode e é…

Mas também é a estratégia mais indicada para respeitar o “politicamente correcto”, zelando pela sua escrupulosa observação (“comme il fault“), e para conseguir, ainda assim, sobreviver ao “massacre” verbal infligido por algumas pessoas…

 Se olharem para vós, esboçando um pequeno sorriso, e se vos acenarem ligeiramente com a cabeça durante o tempo em que estiverem a falar numa reunião, desconfiem… Desconfiem que isso signifique o que parece e que possa ser afinal uma manifestação de hipocrisia, típica de quem se esforça por respeitar o “politicamente correcto” e evitar a denominação de “persona non grata“…

 E por falar (novamente) em “politicamente (in)correcto”, lembrei-me de uma expressão utilizada por uma amiga, quando desiste de tentar compreender algumas pessoas: “Eles que são brancos, eles que se entendam!”.

 Eu, branca, sem grandes propensões para cometer excessos, mas com uma certa tendência para o “politicamente incorrecto”, concordo plenamente com a minha amiga…

 Nota: Alerta-se para a presença de muita ironia, de muito sarcasmo e de algum “politicamente incorrecto”, susceptíveis de poder ferir algumas sensibilidades…  (Matilde) MAR142021