A disforia dos números -José Batista:

A disforia dos números -José Batista

O preço das favas disparou em 2020. Resultado: venderam-se menos 600 toneladas que em 2019. Muitas pessoas morrem de fome, mas as favas foram para o lixo.

No início da pandemia, Portugal foi campeão das estatísticas: menos casos, menos mortes, fomos os melhores.

Morreram muitos milhares de pessoas com outras doenças, mas não importa, não contaram para as estatísticas.

Milhões de pessoas deixaram de ter consultas, ou cirurgias, ou transplantes, e acabaram por morrer, mas não aumentaram os números Covid.

O drama surgiu apenas quando batemos o record nas estatísticas da pandemia, ficamos muito mal no retrato, fomos impedidos de viajar para outros países, destruímos as estruturas do turismo porque não controlámos os números.

São os números que contam, as pessoas não interessam.

As médias dos exames do 12º ano baixaram muito neste ano de 2021 em relação ao ano passado.

Os jornais, que comandam estas oscilações e determinam se os exames devem subir ou descer o nível de exigência, que os responsáveis respeitam docilmente, entenderam que 2020 foi uma “balda” justificada pela pandemia, este ano era preciso levantar o nível.

Os examinadores apertaram o critério e aí está, todas as disciplinas baixaram, exceto o Português.
Mas afinal o que é que determina estas oscilações?

Os alunos de 2021 são mais estúpidos, perdão, menos inteligentes, que os do ano anterior?

Estudaram menos?

Os professores não ensinaram bem?

Os examinadores foram mais cruéis?

Ou foi o ME que se armou em durão e quis dar aos números a autoridade que deveria estar ancorada noutros fatores?
Os números são falsos.

Os números Covid escondem o lado trágico de um SNS que não tem nem estruturas nem profissionais em número suficiente para evitar o descontrolo no combate à calamidade.

A oscilação artificial das médias nos exames, para além de assentar em critérios falsos, traduz a incapacidade do governo e do ME para ancorarem a responsabilidade de aprender nos locais e atores certos: os alunos, os professores e as escolas.

As favas são uma invenção sem fundamento, logo, falsa.

Mas não é mais falsa que os números da saúde ou da educação.