Quando a direcção política da Educação pública é entregue a políticos de frágil conhecimento, a exposição à contaminação por emoções, crenças e ideologias pode gerar uma “Educação do Estado”.
É o que temos: uma escola mínima, hipócrita, de fancarias pedagógicas, de chavões, de cedências fáceis, numa palavra, um albergue para o pensamento único oportunista, que compromete o futuro dos jovens e do país.
Este é o preâmbulo que, em meu entender, caracteriza o estado actual da Educação em Portugal.
Muitos docentes defendem a premissa, confundindo a eficácia da aprendizagem com o aspecto lúdico da abordagem pela descoberta.
Com efeito, a teoria da aprendizagem pela descoberta assenta na frágil ideia segundo a qual, se um cientista chega a novos conhecimentos pela experimentação, o mesmo pode ser conseguido por uma criança, em situação de aprendizagem. Kirschner, que aqui refiro por tantos outros que têm refutado a teoria ao longo dos tempos, postula que as crianças não podem aprender ciência com os mesmos métodos com que os cientistas fazem ciência.
Já porque não têm os conhecimentos prévios que lhes devem ser transmitidos pelo ensino directo e dirigido, já porque, obviamente, o seu desenvolvimento neuronal não lhes permite pensar como cientistas. [Kirschner, P. A. (2009). Epistemology or Pedagogy, That Is The Question. In S. Tobias & T. M. Duffy. Constructivist Instruction: Success or Failure? (pp. 144-157). New York: Routledge].
A consequência das diletâncias, de que a anterior é um exemplo, ficou patente nos últimos resultados divulgados pelo Iave. A maior parte das crianças do 2.º ano do ensino básico não entende o que lê e não sabe escrever.
Mais de metade dos alunos do 9.º ano (57,7%) teve “negativa” na prova de aferição de Matemática (45% de respostas certas, em média, que comparam com 55% dos resultados dos exames de 2019).
O grupo mais numeroso (8368 alunos) ficou-se, apenas, por 20% de respostas certas.
Cerca de 4000 alunos obtiveram resultados entre 0 a 0,5%!
A Português, 38% ficaram num nível negativo, com um resultado médio que, por comparação com 2019, desceu de 60% para 55%.
A pedagogia oficial vem enganando, assim, os alunos, na medida em que lhes passa a ideia de que transitar de ano e ter sucesso escolar não requer trabalho e empenho.
Os alunos que em casa têm outras referências interrogam-se sobre se vale a pena aplicarem-se, quando verificam que colegas indolentes, que pouco ou nada fazem, conseguem o mesmo reconhecimento escolar que eles.
Há hoje uma desconformidade preocupante entre os compromissos que a Escola não pede e aqueles que a vida fora dela exige.
Na “Educação do Estado”, a fantasia da inclusão caminha de passo síncrono com a fantasia do sucesso.
Uma e outra centram-se exclusivamente nos professores e esquecem os fenómenos sociais e económicos que estigmatizam as famílias dos alunos e a não existência nas escolas de recursos mínimos, humanos e materiais.
Uma nota final sobre a falta de professores.
A 6/7/22, na AR, António Costa reconheceu que o país tem “um problema sério em matéria de professores” e anunciou a aprovação de um diploma no Conselho de Ministros do dia seguinte com “duas medidas da maior importância”.
Mas essas medidas foram, tão-só, remendos para os grupos disciplinares e áreas geográficas onde o desastre é maior, intervenções casuísticas sem correspondência às realidades e às necessidades do sistema, onde os sucessivos governos do PS, incapazes de proceder à revisão global dos diplomas que regulam os concursos e os quadros, apenas vão acrescentando injustiças e atropelos à ignomínia que criaram.
Acresce que, no quadro de um concurso de âmbito nacional, as vantagens oferecidas a uns e cerceadas a outros talvez não estejam em conformidade com os ditames constitucionais.
Mas, reconheça-se, que importância pode ter isso para António Costa, que já teve o topete de dizer que, neste reino, cumpre-se o que ele decide, diga a Constituição o que disser?
A solução séria, a única solução, não pode ser outra que não o alargamento dos quadros das escolas, a reestruturação da carreira docente, a desburocratização do trabalho, o reconhecimento da independência intelectual, científica, pedagógica e metodológica dos professores, a sua valorização salarial, a formulação de uma avaliação de desempenho justa e a radical intervenção nos concursos de recrutamento e mobilidade.